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INTRODUÇÃO
leis que explicam o funcionamento dos algoritmos são incompletas e precisam ser
entendidas e explicadas a partir dos níveis de organização do cérebro.
Os avanços da neuroimagem vêm contribuindo para permitir cruzar a ponte
que vai do cérebro à mente. Nos primórdios de seu desenvolvimento, a frenologia
procurava a localização cerebral das funções – agenda que percorreu vários desca-
minhos e que foi parcialmente retomada por algumas vertentes da neurociência.
Menos do que localização física de funções cerebrais, a neuroimagem permite um
acesso mais direto ao pensamento do que a simples análise do comportamento pro-
posta por Piaget ou Skinner – e tantos outros. Tomemos um exemplo familiar, a
aprendizagem da leitura.
A neuroimagem permite identificar a quantidade de atividade metabólica e a co-
nectividade entre os neurônios, assim como a difusão da ativação entre redes locais
e entre sistemas mais completos. Por exemplo, a comparação entre indivíduos nor-
mais e portadores de anomalias, como o disléxico, permite desvendar esse funcio-
namento. Outras técnicas psicofísicas permitem, por exemplo, predizer a acuidade
visual e descrever como a representação da forma visual se delineia no cérebro. Essas
técnicas permitem inferir que as “imagens mentais” têm uma natureza analógica
– elas reproduzem o mundo dos estímulos por analogia, utilizando algoritmos e
reconstruções físicas permitidas pela arquitetura do cérebro. O conhecimento so-
bre os mecanismos de funcionamento do cérebro torna inviável, portanto, sustentar
hipóteses construtivistas a respeito da apreensão idiossincrática ou culturalmente
mediada e, também, permite-nos entender as limitações do cérebro para tomar de-
cisões racionais.
As leis do processamento cerebral, baseadas em modelos importados das ciên-
cias da informação, lançam hipóteses para nos ajudar a compreender cada vez mais
o funcionamento do cérebro. Mas essas contribuições são muito limitadas na me-
dida em que as ciências da informação descrevem sistemas lógicos e racionais, ao
passo que os sistemas da mente estão longe de sê-los. Nas palavras de Lyall Watson:
se nosso cérebro fosse simples, nós seríamos muitos simples para compreendê-lo.
Além da complexidade, o cérebro é confrontado permanentemente a uma realidade
exterior em constante mudança, dificilmente previsível.
3. As leis psicológicas
O terceiro conjunto de leis refere-se às imagens mentais, e seriam essas as leis
psicológicas propriamente ditas, mas que necessariamente devem ser consistentes
com os dois conjuntos anteriores de leis.
Imagens mentais permitem-nos aprender as leis da física – embora isso requeira
experiência e aprendizagem: também somos capazes de ilusões perceptivas. Somos
equipados com elementos rudimentares que nos permitem internalizar as leis da
natureza: nós não construímos ou reconstruímos o mundo a partir do nada ou a
partir de experiências ou do contexto sociocultural, mas precisamos adquirir ou-
tros tipos de conhecimentos além das imagens mentais. Algumas dessas imagens
mentais criam um isomorfismo psicofísico, ou seja, permitem-nos reproduzir men-
talmente as formas (e leis) que regem os fenômenos da natureza. A tese darwiniana
torna evidente que nem nós – nem os demais seres vivos – seríamos capazes de
sobreviver sem dispor de formas mínimas para decifrar os contornos e estímulos
de nosso ambiente. Trazemos em nós, portanto, a capacidade de produzir represen-
tações mentais dos objetos cujas leis imitam as leis da física e da geometria. É esse
o tema que domina a agenda da psicologia – especialmente a psicologia cognitiva.
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