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DESENVOLVIMENTO INFANTIL: O QUE DESENVOLVE?
As leis da psicologia
Impactado por esse novo cenário, no ano de 2006, o Collège de France, uma
tradicional instituição acadêmica, convidou o matemático/neurocientista Stanis-
las Dehaene, a quem coube criar a Cátedra de Psicologia Cognitiva Experimental
naquela ilustre instituição. Em sua aula inaugural, Dehaene apresentou um progra-
ma de trabalho para a psicologia como ciência, lastreado em três conjuntos de leis
(DEHAENE, 2006).
1. As leis da biologia
Primeiro há as leis da biologia: o pensamento está ancorado na biologia do cére-
bro – esta formidável máquina química onde se encontram mecanismos molecula-
res idênticos aos encontrados nos demais seres vivos. Esses mecanismos viabilizam
e explicam a velocidade de nossas operações mentais e de nossas aprendizagens. O
organismo age e aprende movido pela propagação de sinais elétricos, os quais pro-
vocam mudanças moleculares nos receptores das membranas do nosso cérebro. A
biologia ajuda-nos a entender que conseguimos coordenar várias operações simul-
tâneas, pois esses mecanismos operam de forma paralela e sua velocidade se mede
em milissegundos. A mielinização dos axônios acelera a comunicação entre esses
diferentes subsistemas – produzindo feitos que atribuímos a essa central – o cére-
bro. As leis da biologia são essenciais para entender e avançar nosso conhecimento
de como funciona o cérebro que, por sua vez, comanda o resto do corpo.
2. As leis das ciências da informação
Segundo Dehaene, a psicologia deve incorporar as leis das ciências da compu-
tação, o funcionamento dos algoritmos. Essas ciências desenvolveram-se de forma
vertiginosa a partir dos anos 50 do século XX. Hoje sabemos que os sistemas que
compõem o organismo geram algoritmos para resolver diferentes tipos de pro-
blema: reconhecer objetos, pessoas, faces, movimentos, armazenar informações,
aprender gramáticas, sintaxes, línguas diferentes etc. O cérebro é muito mais com-
plexo do que qualquer computador – mas as leis básicas de seu funcionamento
são semelhantes e sujeitas às coerções que regem o funcionamento dos algoritmos.
Como há poucos mecanismos eficazes para resolver determinados problemas,
precisamos recorrer a atalhos e simplificações. O cérebro não é um computador
clássico, ele constitui um exemplar único devido à sua enorme complexidade. A
arquitetura desses sistemas de processar informações e usar algoritmos para tomar
decisões nos permite lidar com situações de extrema complexidade, mas sofre as
limitações das regras do jogo, as coerções dos algoritmos.
Não há biologia separada da psicologia – cérebro e mente estão indissoluvel-
mente interligados. Daí a necessidade de entender a arquitetura do cérebro: são
múltiplos níveis de componentes organizados numa arquitetura em que um mó-
dulo se encaixa no outro e atua em paralelo. Os números envolvidos são incríveis
– estima-se algo como milhões de processadores e mais de um bilhão de conexões.
Nosso funcionamento mental resulta da interação que vai dos estímulos sensoriais
– decorrentes de uma interação social, por exemplo –, às transformações molecu-
lares que ativam os diferentes mecanismos da emoção, da cognição e da ação. As
metáforas de hardware e o software são inadequadas, pois hardware não é dinâmico
e o funcionamento mental não se resume à operacionalização de um algoritmo. As
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